Fim de ano em cartório não é só plantão de RCPN, movimento de escrituras e fechamento de caixa. É também o momento ideal para apertar o “pause”, olhar para trás com senso crítico e decidir, com clareza, como você quer que sua serventia funcione no próximo ano.
Encerrar bem um ciclo significa entender o que funcionou, o que não funcionou e o que precisa mudar — na prática, não só no discurso.
A seguir, um guia para ajudar você a avaliar seu cartório antes de virar o ano, com foco em gestão, segurança jurídica e eficiência.
1. O ano que passou: metas, imprevistos e aprendizados
Antes de qualquer coisa, é importante responder: como foi 2025 para o seu cartório?
Perguntas para guiar essa análise:
- O que você havia planejado no início do ano?
- ampliação de serviços?
- troca de sistema?
- melhoria de atendimento?
- Quais foram os principais resultados:
- aumento ou queda no volume de atos;
- mudança no perfil de usuários;
- novos convênios ou parcerias.
- Quais foram os maiores problemas:
- filas constantes;
- falhas sistêmicas;
- apontamentos em correições;
- conflitos internos na equipe.
Aqui o objetivo não é se culpar, e sim dar nome aos fatos: o que aconteceu, por que aconteceu e o que isso ensina para o próximo ano.
2. Qualidade jurídica e conformidade normativa
A base de qualquer serventia é a segurança jurídica. Na avaliação de fim de ano, vale olhar para:
- Houve apontamentos relevantes em correição?
- foram corrigidos de forma estrutural ou apenas “apagando incêndio”?
- Houve decisões judiciais reformando atos do cartório com frequência?
- qual o padrão dos erros apontados?
- Os modelos de atos (escrituras, notas, certidões, requerimentos, notas devolutivas) estão:
- atualizados em relação aos provimentos e ao Código de Normas;
- claros para o usuário;
- padronizados internamente?
- Rotinas obrigatórias (COAF, comunicações eletrônicas, SNP, centrais de cada especialidade, registros obrigatórios) estão sendo cumpridas com:
- regularidade;
- registro interno;
- responsável definido?
Se você identifica que a serventia passa o ano inteiro “correndo atrás da norma”, esse é um sinal claro de que 2026 precisa ter rotinas preventivas, não só reativas.
3. Atendimento e experiência do usuário
Mais do que “atender rápido”, o cartório precisa atender bem. Avalie:
- Como está a experiência do usuário nos principais canais?
- balcão presencial;
- telefone;
- WhatsApp institucional;
- e-mail;
- site ou redes sociais (se houver).
- Quais foram as principais reclamações em 2025?
- demora;
- falta de informação clara;
- dificuldade em entender documentos exigidos;
- linguagem muito técnica.
- Existem momentos de pico mal administrados?
- finais de mês;
- início de manhã;
- períodos pós-feriado.
- A comunicação básica está clara?
- horários especiais de fim de ano;
- tabela de emolumentos;
- atos gratuitos e direitos do cidadão;
- documentos necessários para os principais atos.
Um bom encerramento de ciclo é reconhecer, com honestidade: o cartório está entregando apenas “o mínimo legal” ou está realmente cuidando da experiência de quem chega em busca de orientação e segurança?
4. Organização interna, processos e produtividade
Aqui é olhar para dentro: o cartório está organizado para trabalhar bem ou tudo depende de “pessoas salvadoras” que resolvem as crises?
Avalie:
- Fluxos de trabalho estão mapeados?
- nascimento, casamento, óbito, escritura, protesto, registro de imóveis, RTD, PJ etc.
- Existe retrabalho frequente?
- atos refeitos;
- títulos devolvidos várias vezes;
- certidões que precisam ser reemitidas.
- Os prazos internos (além dos legais) estão sendo respeitados?
- Há excesso de dependência em algumas pessoas:
- “só fulano sabe fazer tal ato”;
- risco grande quando alguém sai de férias ou se afasta.
- A distribuição de tarefas é equilibrada entre os prepostos ou há sobrecarga?
Encerrar o ciclo significa também olhar se o cartório trabalha de forma previsível e padronizada, ou se vive em um modo constante de improviso.
5. Equipe: desempenho, clima e desenvolvimento
Nenhuma melhoria se sustenta se a equipe não estiver bem.
Pontos para avaliar:
- O clima organizacional ficou mais leve, estável ou tenso ao longo do ano?
- Houve muita rotatividade (entradas e saídas)?
- Os principais cargos estão bem ocupados?
- balcão;
- qualificação de títulos;
- lavratura;
- caixa;
- suporte administrativo.
- A liderança está presente?
- feedbacks regulares;
- alinhamento de expectativas;
- acolhimento em momentos de pressão.
- Houve capacitação efetiva em 2025?
- cursos técnicos;
- treinamentos de uso de sistema;
- orientações sobre novas normas;
- desenvolvimento de habilidades comportamentais (atendimento, comunicação, trabalho em equipe).
No encerramento de ciclo, vale também perguntar:
quem cresceu, quem está pronto para mais responsabilidade e quem precisa de apoio mais próximo em 2026?
6. Saúde financeira e sustentabilidade do negócio
Cartório é delegação de serviço público, mas a gestão financeira precisa ser profissional.
Na avaliação de fim de ano, olhe para:
- Como ficou o resultado financeiro do ano?
- houve sobra saudável de caixa ou o ano fechou no limite?
- As principais fontes de receita estão claras:
- quais especialidades mais faturam;
- quais serviços estão crescendo ou caindo.
- Os atos gratuitos e ressarcidos estão sob controle:
- há perdas por falta de lançamento correto?
- há pedidos de ressarcimento indeferidos por falhas formais?
- As principais despesas:
- folha de pagamento;
- tecnologia e sistemas;
- estrutura física;
- segurança;
- treinamentos.
Foram revisadas e otimizadas ao longo do ano?
- Há reserva financeira mínima para enfrentar:
- oscilações na tabela de emolumentos;
- manutenção inesperada;
- investimentos urgentes em tecnologia ou estrutura.
Encerrar o ciclo financeiro com clareza ajuda a planejar, com responsabilidade, onde será possível investir em melhorias no próximo ano.
7. Tecnologia, segurança da informação e riscos operacionais
A tecnologia deixou de ser apoio para se tornar espinha dorsal da operação.
Na avaliação de fim de ano, considere:
- Quantas vezes o cartório ficou parado por:
- queda de sistema;
- problemas de hardware;
- falhas de internet;
- indisponibilidade de integrações.
- Houve incidentes de:
- perda de dados;
- necessidade de restauração de backup;
- falhas de segurança da informação.
- Os backups estão:
- automatizados;
- testados;
- armazenados fora do local físico do cartório (off-site)?
- Os acessos ao sistema:
- são individuais e rastreáveis;
- seguem uma lógica de perfis;
- são revogados imediatamente quando alguém sai.
- A equipe sabe o básico de cibersegurança?
- cuidado com anexos e links;
- uso de senhas fortes;
- não compartilhamento de logins;
- postura adequada com dados pessoais (LGPD).
Se a resposta para muitas dessas perguntas é “não” ou “não sei”, 2026 precisa incluir um plano concreto de gestão de riscos e segurança tecnológica.
8. Imagem institucional e relacionamento com o entorno
O cartório não vive isolado: ele se relaciona com a comunidade, com a Corregedoria, com outros órgãos e com a classe.
Na hora de encerrar o ciclo, reflita:
- Como está a relação com:
- Corregedoria local;
- Ministério Público;
- advocacia da região;
- prefeituras e órgãos públicos;
- bancos e empresas com grande volume de títulos.
- O cartório participou de:
- eventos da classe;
- capacitações institucionais;
- projetos de aproximação com a sociedade (palestras, mutirões, ações educativas)?
- Sua imagem perante o público é de:
- burocracia e frieza; ou
- serviço essencial confiável e acessível?
Encerrar o ano fazendo esse balanço ajuda a definir qual posicionamento institucional você quer fortalecer no próximo ciclo.
9. Projetos iniciados, projetos adiados e novas prioridades
Todo ano começa cheio de ideias. No fim, algumas foram à frente, outras ficaram pela metade e outras nunca saíram do papel.
Antes de virar o ano, liste:
- Projetos concluídos em 2025:
- o que funcionou bem e merece ser ampliado?
- Projetos iniciados e não finalizados:
- ainda fazem sentido?
- precisam de ajustes ou de mais recursos?
- Projetos que ficaram na gaveta:
- seguem prioritários para 2026 ou perderam o timing?
A partir desse filtro, escolha com clareza:
- 3 prioridades estratégicas para o próximo ano (por exemplo:
- elevar o nível de conformidade e padronização;
- investir em capacitação da equipe;
- fortalecer a segurança da informação e os backups).
Menos é mais: é melhor escolher poucas prioridades e executá-las bem do que tentar abraçar tudo e não consolidar nenhuma mudança.
10. Como conduzir, na prática, o encerramento de ciclo
Para que essa avaliação não fique só “na cabeça do oficial”, transforme o encerramento de ciclo em um movimento estruturado:
- Reunião de fechamento
- compartilhe dados do ano;
- apresente conquistas e desafios;
- dê espaço para a equipe trazer percepções e sugestões.
- Registro em documento
- elabore um relatório interno de encerramento de ciclo;
- organize por temas: jurídico, processos, equipe, finanças, tecnologia, imagem institucional.
- Plano sintético para o novo ano
- defina prioridades;
- atribua responsáveis;
- estabeleça prazos;
- crie uma rotina de acompanhamento (mensal ou bimestral).
O objetivo é transformar a avaliação em compromissos concretos, que possam ser acompanhados ao longo do ano seguinte.
Conclusão: virar o ano com consciência, não só com calendário novo
Encerrar um ciclo no cartório é mais do que pendurar um calendário novo na parede. É escolher, de forma consciente, o que você quer levar para 2026 e o que precisa ficar em 2025.
Olhar para o jurídico, para a gestão, para as pessoas, para a tecnologia e para a imagem institucional com honestidade é um ato de responsabilidade com o cidadão e com a própria delegação.
Com uma boa avaliação de fim de ano, o cartório entra no próximo ciclo mais maduro, mais organizado e muito mais preparado para crescer com segurança e eficiência.